Venda da V.tal – Globenet ou GOLPE net na RJ da Oi?

O anúncio do acordo de venda da unidade de fibra da Oi para o BTG, em junho de 2022, foi uma surpresa amarga para o mercado e para os acionistas da companhia. Quando todos esperavam que a Oi ficasse com 49%, tal como previsto no plano, a Oi anuncia que ficaria com pouco mais de 34%. Para piorar a situação, a entrada no caixa da companhia fica abaixo do previsto e, em vez de dinheiro, surge a Globenet no negócio.

Depois de conhecidas as condições da venda, foram várias as revisões em baixa do preço-alvo da ação Oi e as avaliações negativas ao negócio. Vamos escolher, de forma completamente aleatória – com venda nos olhos que nem a justiça -, um trecho de uma análise ao negócio que nos pareceu independente e realista: “Uma redução na participação de 7,4 p.p. Oi na V.tal seria equivalente a uma redução de R$ 2,4 bilhões no valor para o acionista da Oi, ou cerca de R$ 0,40 por ação“. Sabe qual a entidade que fez esta análise? O BTG!

Pode acessar aqui o relatório do BTG de 10 de junho de 2022

Analisámos os documentos e os fatos para entender o que aconteceu no processo. Por que o negócio não foi concluído ficando a Oi com os 49% previstos? Por que entrou menos dinheiro no caixa da Oi quando o que a companhia buscava era reforçar o caixa?

Gostamos de apresentar os fatos e sustentar devidamente as explicações, por isso, a matéria é longa. Se o leitor estiver ansioso ou com pouco tempo pode pular para a última parte e mais tarde ler o restante da matéria.

O Propósito da Venda de Ativos era claro: Novos Recursos para o Caixa da Oi

O Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial (APRJ) aprovado em 8 de setembro de 2020 , introduziu a estruturação em várias unidades produtivas para venda, com vista à maximização das receitas. O objetivo era bem claro: “maximizar o retorno de caixa“, conforme pode ler abaixo no excerto do APRJ.

Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 14

Num outro ponto, mais uma vez, o objetivo ficou claro: obter receitas para proporcionar os recursos necessários para a preservação da empresa.

Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 17

Ao longo do documento são referidos e reforçados por várias vezes os mesmos argumentos, de modo a que não existam quaisquer dúvidas: levantar novos recursos para superar a crise econômico-financeira da empresa.

Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 27

Não restavam, portanto, quaisquer dúvidas sobre o propósito da venda das unidades de negócio, fosse a venda total, como foi o caso da unidade móvel, ou parcial, como a unidade de fibra: ganhar caixa para a empresa.

A Venda da InfraCo (atual V.tal) – As Condições Previstas: R$ 6,5 bi + R$ 5 bi

O nome inicial dado à unidade de fibra, que atualmente se chama V.tal, foi InfraCo. O APRJ detalhou quais as condições e os valores pretendidos pela Oi pela sua unidade de fibra UIP InfraCo.

Estavam previstas várias parcelas. Uma das parcelas denominada “Parcela Secundária em Dinheiro (Parcela Secundária UPI InfraCo)” deixa bem claro que a Oi pretendia receber, no mínimo, R$ 6,5 bi em dinheiro.

Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 81 (5.3.9.4)

Além da “Parcela Secundária em Dinheiro”, a Oi previa um aumento de capital para a InfraCo (atual V.tal) até R$ 5 bi através de uma parcela que denominou de “Parcela Primária UPI InfraCo”. Teria todo o sentido, uma vez que, a intenção seria capitalizar a empresa para continuar o investimento na expansão da rede de fibra, aliviando o CAPEX da Oi .

Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 81 (5.3.9.4)

Conforme o trecho abaixo, ficava também bem claro que o percentual do novo sócio na InfraCo não poderia exceder 51% ficando, portanto, a Oi com 49% da empresa.

Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 82

Existia ainda a possibilidade da Parcela Primária ser realizada através da contribuição de ativos, desde que, existisse um pagamento em dinheiro equivalente, no mínimo, ao valor da Parcela Secundária Mínima que era de R$ 6,5 bi, conforme trecho abaixo.

Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 82 e 83

No que respeita aos ativos, caso surgisse essa possibilidade, a Oi comprometia-se ainda a contratar uma avaliação independente e poderia recusar os ativos por várias razões, entre as quais, a inexistência de sinergias com as operações e negócios da InfraCo (atual V.tal) ou pudessem causar um efeito adverso para a Oi e para o cumprimento do seu plano.

Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 83
Aditamento ao Plano de Recuperação Judicial – Página 84

As condições, que aqui resumimos, eram claras. A Oi pretendia receber dinheiro para reforçar o seu caixa e aumentar o capital da InfraCo (V.tal) para conferir capacidade de investimento à empresa de fibra de modo a assegurar o seu crescimento.

Como foi então a Venda da V.tal ?

Para detalhar a venda da Infraco (V.tal), vamos recuar a 9 de junho de 2022, data de publicação do Fato Relevante – Fechamento da Operação de Alienação Parcial da UPI InfraCo e a 10 de junho de 2022, quando a Oi divulgou o Comunicado ao Mercado – Apresentação do Fechamento da V.tal.

Atentemos aos trechos abaixo dos Fatos Relevantes (FR).

Fato Relevante – Fechamento da Operação de Alienação Parcial da UPI InfraCo (9-6-2022) – Página 2
Comunicado ao Mercado – Apres. Fechamento da V.tal (10-6-2022) – página 8

Vamos então analisar o que aconteceu com a “Parcela Secundária em Dinheiro” que previa R$ 6,5 bi em dinheiro, tal como o nome indica, a entrar no caixa da Oi.

Vamos já adiantando a resposta para não aumentar a ansiedade do leitor. Entraram R$6,5 bi no caixa da Oi ? Não.

O que aconteceu então? Aparentemente, ao ler o FR interpretamos que entraram R$ 8 bi, divididos em 3 parcelas, em vez dos R$ 6,5 bi pretendidos pela Oi. Parece bom demais para ser verdade, não é? Pois é. Era bom demais.

O que aconteceu é que só entraram no caixa da Oi R$ 4,262 bi. As restantes duas parcelas, uma de R$ 1,323 bi e outra de R$ 2,425 bi, a Oi fica só “acenando de longe” porque saem do “investidor” diretamente para a V.tal por conta do contrato da Oi com a Globenet. A Oi nem viu a cor desse dinheiro. Aliás, nem a Oi nem os bancos credores, que ficaram acenando também porque aguardavam um “evento de liquidez” para amortizar a dívida (saiba mais sobre essa dívida aqui).

Ironia do destino, a empresa queria tanto receber dinheiro que a própria parcela se chamava “Parcela Secundária em Dinheiro”. Afinal, não foi bem assim. Poderiam ter chamado Parcela Secundária do Dinheiro Voador. Seria bem mais realista.

E a Parcela “Parcela Primária UPI InfraCo”, aquela com o objetivo de capitalizar a InfraCo (V.tal) até R$ 5 bi?

Essa também teve um desfecho diferente do previsto. Os R$ 5 bi, no final, com promoção, saíram por R$ 1,776 bi.

E o percentual do novo sócio? Ah o percentual do investidor, com o acordo em que não entrou o dinheiro previsto no caixa da Oi nem o aumento de capital previsto na InfraCo (V.tal), ficou, como previsto, nos 51%. Afinal, alguma coisa teria que ficar dentro do previsto!

Mas a história trazia um capítulo extra.

Fato Relevante – Fechamento da Operação de Alienação Parcial da UPI InfraCo (9-6-2022) – Página 2

Como no fechamento não ficava bonito a Oi ficar logo com menos do que os 49% previstos, surgiu uma segunda etapa, pós-fechamento, que trataria de reduzir a participação da Oi na InfraCo (V.tal) para 34,7%.

A apresentação de 10 de junho de 2022 ilustra o que sucedeu:

Comunicado ao Mercado – Apres. Fechamento da V.tal (10-6-2022) – página 9

Os pontos 3 e 4 do quadro acima são a tal segunda etapa, pós-fechamento. Aqui entra a Globenet, avaliada em R$ 1,5 bi, e aumenta o capital da V.tal com mais R$ 1,6 bi. Com esta operação a participação da Oi passa de 49% para 42,1 %.

Como se não bastasse, ainda houve lugar para ajustes adicionais – adivinhe para que lado? Claro, para reduzir a participação da Oi, que ficou então reduzida a 34,7%.

Resumindo, a Oi queria receber no seu caixa R$ 6,5 bi mas entraram R$ 4,2 bi. O aumento de capital pretendido para a V.tal era de R$ 5 bi e ocorreu um aumento de R$ 1,776 bi no fechamento, mais um adicional de R$ 1,6 pós-fechamento. A Globenet foi avaliada em R$ 1,5 bi e passa a fazer parte da V.tal.

A questão é: Por que é que a Oi aceitou fechar este negócio?

  • Entrou menos dinheiro no caixa da Oi do que o mínimo previsto.
  • A capitalização da V.tal em dinheiro foi inferior ao previsto, porque independentemente da avaliação da Globenet, não é capital para construir rede de fibra.
  • Que valor agrega a Globenet aos negócios da V.tal? Estava previsto no APRJ que a Oi poderia recusar ativos que não fizessem sentido para o seu negócio.
  • A Oi acabou com um percentual abaixo do previsto através de uma operação pós-fechamento que não é o esperado no APRJ.
  • A Globenet é um ativo bom ou vai se revelar um ativo tóxico nas contas da V.tal?
  • Qual o valor da Globenet apurado pela avaliação independente?
  • Por que o contrato – a dívida – com a Globenet não foi negociado no escopo do processo de recuperação judicial tal como as restantes dívidas?
  • O que opinou a Justiça de tudo isto?

Para perder a V.tal e ainda não ter assegurado uma capitalização que dê garantias de capacidade de investimento, não valeria mais a V.tal ter continuado integralmente a pertencer à Oi?

O resultado está à vista de todos. A Oi está preparando uma segunda Recuperação Judicial.

Fica novamente a questão: Por que é que a Oi aceitou fechar este negócio? O que resolveu além de perder a maior parte do seu melhor ativo por um preço absurdo?

Nota: As informações publicadas são opiniões, interpretações e estimativas, podem não ser exatas ou corretas e não devem ser tomadas em conta para qualquer ação ou decisão de investimento. As informações oficiais devem ser procuradas junto da empresa e das autoridades competentes.


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